POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES NO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
A violência contra as mulheres é um dos problemas públicos de maior visibilidade social e política no país, exigindo dos gestores públicos a elaboração, execução e monitoramento de políticas públicas para prevenção e combate à violência contra as mulheres, assim como de proteção e garantia de direitos às mulheres em situação de violência, conforme normas e instrumentos internacionais de direitos humanos e legislação nacional.
Mato Grosso do Sul é um Estado pioneiro na defesa dos direitos das mulheres, especialmente no que tange às políticas de enfrentamento à violência. Antes mesmo do capítulo XIV ser acrescentado (Emenda Constitucional nº 23, de 22 de outubro de 2003), à Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul, já existiam órgãos de defesa dos direitos da mulher e de atendimento às mulheres em situação de violência, responsáveis pela elaboração e execução das políticas públicas para mulheres.
O Conselho Estadual de Direitos da Mulher, órgão colegiado de deliberação coletiva, de composição paritária entre o Governo e a sociedade civil organizada, integrante da estrutura da Secretaria de Governo e Gestão Estratégica, com a finalidade propor e fiscalizar, em âmbito estadual, políticas para a mulher, assegurando-lhe o exercício pleno de seus direitos, sua participação e integração no desenvolvimento econômico, social, político e cultural, foi instituído pelo decreto-lei nº 11, de 1º de janeiro de 1979. (Com redação dada pela lei estadual nº 702, de 12 de março de 1987 e reorganizado por meio do decreto nº 13.373, de 14 de fevereiro de 2012).
A Delegacia de Atendimento à Mulher de Campo Grande foi implantada no ano de 1986, destacando-se como a segunda do Brasil (a primeira foi na cidade de São Paulo, em 1985). E antes mesmo da criação do primeiro organismo nacional de políticas para mulheres no Governo Federal (2002), o Estado também já contava com um órgão estadual para gestão das políticas públicas para mulheres (Coordenadoria Especial de Políticas para Mulheres, 1999).
O Centro de Atendimento à Mulher (CAM Cuña M’baretê), criado por meio do decreto nº 9.673, de 22 de outubro de 1999, atualmente denominado “Centro Especializado de Atendimento à Mulher - CEAM Cuña M’baretê (Reestruturado pelo decreto estadual nº 14.270, de 5 de outubro de 2015).
Ainda em 1999, foi instituída a Defensoria Pública de Defesa da Mulher – aliás, a primeira no Brasil. A Casa Abrigo para mulheres vítimas de violência em risco de morte foi implantada em 2001, sendo desde então mantida pela pasta da assistência social, do Governo do Estado. Desde 2014 são atuantes os núcleos especializados no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar no âmbito da Defensoria Pública (NUDEM) e do Ministério Público Estadual (NEVID).
Mas o ano de 2015 consagrou-se como um marco nas políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres em Mato Grosso do Sul, em razão da inauguração da primeira unidade da Casa da Mulher Brasileira (equipamento previsto pelo programa “Mulher, Viver sem Violência”, da Secretaria de Políticas para Mulheres do Governo Federal), do Brasil; da implantação do plantão 24h da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher em regime, inclusive em finais de semana e feriados (DEAM instalada na Casa da Mulher Brasileira) e da criação da 3ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, considerada a 1ª Vara Especial de Medidas Protetivas do Estado de Mato Grosso do Sul (e também a primeira do país, na Casa da Mulher Brasileira).
Feito esse panorama dos órgãos e serviços existentes, depreende-se que o Estado de Mato Grosso do Sul possui políticas de combate e prevenção à violência contra a mulher, as quais são coordenadas por um órgão gestor estadual, denominado Subsecretaria de Políticas Públicas para Mulheres, atualmente vinculado à Secretaria de Estado de Governo e Gestão Estratégica (SEGOV - Lei estadual nº 5.304, de 21 de dezembro de 2018).
REDE ESPECIALIZADA DE ATENDIMENTO À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA
DAS DELEGACIAS DE ATENDIMENTO À MULHER
O compromisso do Estado de Mato Grosso do Sul com o enfrentamento a todas as formas de violência contra as mulheres vem de longa data, assim como a preocupação com o atendimento humanizado e especializado para aquelas que tenham sido vítimas, por delegadas do sexo feminino, observando os princípios da não-discriminação e não-revitimização, conforme Norma Técnica de Padronização das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (SPM-PR, MJ/SENASP e UNODC, atualizada em 2010), na esteira do que determina a Lei Maria da Penha (11.340/2006) e os tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário, dentre os quais a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW, 1979) e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará, 1994).
Importante lembrar que a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) de Campo Grande, passou a funcionar em regime de plantão 24h, inclusive em finais de semana e feriados, a partir de 15 de janeiro de 2015 (Portaria DGPC/MS 112, de 9 de janeiro de 2015 – DOMS 8.839, de 13/01/2015, pág. 5), atendendo assim um antigo clamor das mulheres, de movimentos sociais e movimentos feministas, uma vez que a violência doméstica e familiar ocorre repetidamente aos finais de semana e períodos noturnos. A DEAM é a “porta de entrada” da Casa da Mulher Brasileira de Campo Grande, o primeiro serviço a iniciar a investigação criminal da violência noticiada.
No interior do Estado, as Delegacias de Atendimento à Mulher tem como competência atender, investigar e apurar as ocorrências policiais nos delitos referentes à integridade física e moral da mulher, incluindo todos os crimes sexuais contra a mulher e registrar e apurar crimes de assédio sexual contra a mulher, como se vê do decreto nº 11.485, de 26 de novembro de 2003, que criou e reordenou as unidades nos municípios de Aquidauana, Coxim, Fátima do Sul, Jardim, Naviraí, Paranaíba, Dourados, Corumbá, Ponta Porã, Nova Andradina e Três Lagoas.
Registre-se, que o Estado de Mato Grosso do Sul já possui Delegacias de Atendimento à Mulher em suas microrregiões administrativas, enquanto muitos outros Estados ainda concentram as DAM/DEAM apenas nas capitais e grandes centros urbanos, o que ensejou a propositura do Projeto de Lei nº 501/19 (Proposta em trâmite na Câmara Federal, aguardando parecer do relator na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado - CSPCCO), pela deputada federal Leandre (PV-PR), visando obrigar os Estados a criar Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher no prazo de 5 (cinco) anos, sob pena de não terem acesso aos recursos que lhes são destinadas no Fundo Nacional de Segurança Pública.
Em municípios que não possuem Delegacias de Atendimento à Mulher, mas que concentram altos índices de ocorrência por violência doméstica, a Delegacia-Geral da Polícia Civil está implantando as chamadas “Salas Lilás" (Sala Lilás inaugurada nas Delegacias da Polícia Civil dos seguintes municípios: Sidrolândia (07/08/2019), Ribas do Rio Pardo (23/08/2019), Rio Negro (29/08/2019) e Maracaju (27/04/2020) visando oferecer atendimento diferenciado e qualificado às mulheres em situação de violência, pactuando com o executivo municipal a cedência de profissionais de serviço social e psicologia para acolhimento humanizado às vítimas e encaminhamentos para outros órgãos da rede municipal de enfrentamento à violência contra a mulher.
Com ambientação aconchegante e com a proposta de humanizar o atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar, o serviço de proteção oferecido às mulheres em situação de violência está sendo aprimorado, e o novo setor atenderá também crianças e meninas vítimas de violência, preservando-as da espera na recepção comum, disponibilizando brinquedos, livros e atendimento com assistente social e psicóloga.
Destarte, o Estado de Mato Grosso do Sul tem efetivamente observado as Normas Técnicas de Padronização das Delegacias de Atendimento à Mulher, garantindo a implementação de políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica e de gênero na segurança pública, bem como as diretrizes do Manual de Instrução para Procedimento Operacional Padrão (Resolução SEJUSP nº 847, de 02/08/2018 – DOMS 9.712, de 03/08/2018, pág. 20/27) em casos de violência doméstica e feminicídios, atuando de forma integrada com base na prevenção e repressão, realizando de forma continuada a capacitação de profissionais Policiais Civis, na esteira do que determina a Lei Maria da Penha (Lei federal nº 11.340/2006), em seu artigo 8º, incisos IV e VII; verbis:
A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes:
IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher;
VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia;
ACESSO À JUSTIÇA E ASSISTÊNCIA JURÍDICA – DEFENSORIA PÚBLICA
A emenda constitucional nº 25, de 11 de dezembro de 2003, incluiu a obrigatoriedade da assistência jurídica às mulheres em situação de violência ser prestada pela Defensoria Pública do Estado sempre que a mulher, na forma da lei, for juridicamente necessitada – havendo aqui de se destacar, mais uma vez, a vanguarda do Estado de Mato Grosso do Sul nas políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulheres, uma vez que o mesmo dispositivo só viria a ser inserido em âmbito nacional na Lei Maria da Penha, 3 (três) anos mais tarde, como se vê do art. 28, da lei nº 11.340: É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado.
O NUDEM – Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher foi instituído e regulamentado pela Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul em 15 de outubro de 2014, e atualmente existem unidades do NUDEM em Campo Grande, Corumbá, Dourados, Ponta Porã e Três Lagoas.
SERVIÇOS DE SAÚDE
O Estado de Mato Grosso do Sul notifica os casos de violência contra a mulher atendidas em serviços de saúde da rede pública ou privada do Estado de Mato Grosso do Sul (lei nº 3.226, de 28 de junho de 2006). Em Campo Grande e em Dourados o serviço de referência para atendimento médico é o Hospital Universitário.
Em Dourados, o Projeto Acalento permite o exame de corpo de delito e a coleta de vestígios em casos de crimes sexuais no próprio hospital, não havendo necessidade de deslocamento da mulher (ou criança/adolescente) ao instituto médico-legal – o que evita constrangimento e eventual revitimização das vítimas. O atendimento é acolhedor e qualificado, em ambiente diferenciado e exclusivo para atendimento de mulheres.
Em novembro de 2017, o Instituto Médico e Odontológico Legal (IMOL) de Campo Grande recebeu a primeira “Sala Lilás” inaugurada no Estado: um espaço acolhedor, exclusivo para crianças, meninas e mulheres vítimas de violência física e sexual, onde aguardam a realização de exame de corpo de delito com mais conforto e privacidade. Com ambientação aconchegante e com a proposta de humanizar o atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar, a proposta é encorajar as mulheres e meninas a denunciarem as violências sofridas, preservarem as provas do crime e submeterem-se aos exames necessários.
Todos os atendimentos para mulheres vítimas de violência sexual, prestados pelos profissionais da segurança pública e da rede de atendimento do Sistema Único de Saúde são estabelecidos pela lei federal nº 7.958, de 13 de março de 2013.
ATENDIMENTO SOCIAL E PSICOLÓGICO ÀS MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA
CENTROS DE ATENDIMENTO À MULHER (CEAM - CAM/CRAM)
Os Centros de Atendimento à Mulher (CAM) são equipamentos de acolhimento especializados para atendimento exclusivos às mulheres em situação de violência e funcionam em imóveis específicos para tal finalidade, garantindo às mulheres segurança e privacidade, com serviços gratuitos e sigilosos pelo tempo necessário para que superem a situação de violência e reestabeleçam as rédeas de suas vidas. Podem ter denominação de Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM).
O primeiro Centro de Atendimento à Mulher em situação de violência do Estado foi implantado em Campo Grande, por meio do decreto nº 9.673, de 22 de outubro de 1999 (reestruturado pelo decreto estadual nº 14.270, de 5 de outubro de 2015); atualmente denominado “Centro Especializado de Atendimento à Mulher” (CEAM Cuña M’baretê), continua sendo referência estadual no atendimento social e acompanhamento psicológico continuado de mulheres em situação de violência doméstica e familiar, possuindo equipe técnica qualificada e especializada para o atendimento humanizado.
Em 2015 foi criado o espaço infantil e inseridas na equipe técnica 2 (duas) pedagogas para o acompanhamento das crianças enquanto as mães são atendidas; fornece lanche e vale transporte para o deslocamento das mulheres atendidas. Funciona de segunda à sexta-feira, das 7:30h às 17:30h, ininterruptamente e disponibiliza linha gratuita para informações e agendamentos: 0800-67-1236.
No interior do Estado existem 11 (onze) Centros de Atendimento à Mulher, localizados nos municípios-polo: Aquidauana, Corumbá, Coxim, Dourados, Fátima do Sul, Jardim (desativado), Naviraí, Nova Andradina, Paranaíba, Ponta Porã (desativado) e Três Lagoas.
CASA-ABRIGO
A única Casa-Abrigo para mulheres em risco de morte iminente em razão da violência doméstica do Estado de Mato Grosso do Sul está localizada em Campo Grande e é mantida, desde sua inauguração em 2001 pela pasta da assistência social, haja vista sua tipificação como serviço de proteção social especial de alta complexidade (Resolução nº109, de 11 de novembro de 2009, do Conselho Nacional de Assistência Social (Titpificação Nacional de Serviços Socioassistenciais). É um equipamento protegido, sigiloso e temporário, no qual as usuárias permanecem por um período determinado, submetendo-se às regras estabelecidas para manter o anonimato e a segurança de todas.
CRAS e CREAS
Nos municípios que não possuem Centros de Atendimento à Mulher (CAM) ou Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM), o atendimento psicossocial às mulheres vítimas de violência é feito pela rede municipal socioassistencial, que recebe capacitação permanente para atendimento especializado e qualificado.
Atualmente, existem unidades do CRAS em todos os 79 (setenta e nove) municípios do Estado e unidades do CREAS em 68 (sessenta e oito) municípios sul-mato-grossenses.